quarta-feira, 25 de julho de 2012

Perdi meu bom senso na rede


Impressiona-me o poder das mídias digitais, a capacidade delas de interferir na vida das pessoas e até determinar seus hábitos e opiniões. Falando assim, parece até que rede social é um monstrinho, um extraterrestre vivendo disfarçado no planeta Terra para nos controlar despercebidamente. Pior que não, são as pessoas que constroem diariamente essa torre de babel. Compartilhamos e curtimos coisas as quais nem entendemos de verdade, passamos adiante informações que, muitas vezes, são falsas.

Acho cômico – para não dizer trágico - quando leio frases atribuídas erroneamente a um autor – Cara, as pessoas nunca leram o livro e divulgam as supostas frases/ lições contidas nele! Tudo bem, elas são até bonitinhas e cabem perfeitamente como uma citação de autoajuda, mas muitas vezes elas contradizem o que aquela pessoa realmente defendeu em vida – Como eu sei? Ah, desculpa, de fato acompanhei o trabalho do sujeito. A superficialidade das informações disseminadas é assustadora, porém, pode ser aceita como mero entretenimento. No entanto, a sociedade brasileira contemporânea parece estar intrinsicamente associada à discussões rasas, como exemplo, a ida de Luísa para o Canadá e o pseudoestupro “ocorrido” no BBB 12. Esses “fatos” se alastraram pela internet como um vírus de zumbis hollywoodianos.

Pessoas ignorantes – no significado literal da palavra, que é sem conhecimento – se ocuparem dessas notícias é até compreensível. Afinal, como exigir que indivíduos cujo ensino regular compreendeu algumas falas docentes, muita greve, inúmeras trocas de professor em um período letivo e uma completa falta de estrutura, discutam as conjunturas sociais do país? Desculpa, mas estas pessoas necessitam do seu diploma de Ensino Médio para trabalhar e se manter vivas. Além disso, nas escolas brasileiras ninguém nos estimula a pensar, discutir, menos ainda a lutar contra sistemas sociais, mas sim, a engolir tudo o que mastigam para nós, principalmente nas instituições públicas  – querem ensinar a fazer comida uma nação que não tem ovo na panela, como canta Fernando Anitelli. Entretanto, diversas pessoas públicas, músicos, atores e até o jornalismo nacional, se renderam aos peixes dessa rede.

Porém, o que me assusta realmente é a ingenuidade – ou burrice, definam como quiserem – de grande parte dos usuários brasileiros da rede mundial de computadores. Antes de continuar lendo, assista ao vídeo abaixo:

No facebook, esse vídeo de “procura-se” foi curtido por mais de oito mil pessoas que admiraram o romantismo do rapaz, compartilhado por quase cinco mil que desejavam ajudá-lo na sua busca e comentado por quase três mil pessoas – isso sim é buzz! - a maioria delas, elogiou e incentivou a atitude shakespeariana. Pois, na sociedade do espetáculo, uma estória de amor só é grande quando exposta aos seus inúmeros amigos – que nem lhe conhece – e o belo são os pedidos de casamento fantásticos  Sendo assim, todos ansiavam por um final feliz para esse conto de fadas moderno. E o fim, chegou:



Exatamente, Perdi meu amor na balada, foi uma série de três vídeos que integraram uma campanha viral de lançamento do smartphone 808 Pure View da Nokia. O primeiro vídeo compreendeu o apelo de Daniel Alcântara, um rapaz desesperado em busca de um amor que conheceu na balada: “Foi amor à primeira vista. Não acreditava nisso, mas aconteceu”, dizia ele. O nome da garota era Fernanda, e isso era tudo o que ele sabia dela. Daniel lançou a campanha “Perdi meu amor na balada” no Facebook, com direito a retrato falado da moça.

O vídeo seguinte mostrou o rapaz com um buquê de rosas vermelhas na mão em frente ao suposto local de trabalho de Fernanda. Mas não havia alguém com esse nome. No último vídeo, Daniel finalmente encontra seu grande amor. Graças a um dos internautas sensibilizados pela campanha - e dono de um 808 Pure View, que enviou para Daniel um vídeo mostrando a foto que tirou na balada onde Daniel e Fernanda se conheceram. O romântico rapaz aparece ao fundo, recebendo o número de telefone da moça em um guardanapo, o qual ele havia perdido. Em outras palavras, o número de telefone só pode ser visualizado nitidamente devido o potente zoom do smartphone da Nokia. Uma boa propaganda, talvez.

Ocorre que, as pessoas (consumidores) cuja fé depositaram no pobre rapaz apaixonado, sentiram-se lesadas, feridas em seu íntimo sonho de amor romântico, e por isso foram ao Procon, Conar e Pequenas Causas para lutar por seu direitos! Como pode uma empresa nos enganar dessa forma? Será que essa multinacional não sabia que existem brasileiros capazes de agredir atores cujo papel é o de vilão na novela, porque – sabe-se Deus porque! - elas creem na trama, quem dirá em informação divulgada no facebook? Se existissem brasileiros para se indignar desse modo e protestar assim por uma Educação de qualidade, talvez esses equívocos fossem evitados.

...

Algumas observações antes dos julgamentos:

1°) Não afirmei em nenhum ponto do texto que estudante da rede pública de ensino não é inteligente - até porque, modéstia à parte, estudei em escola pública à vida toda. O que fiz foi criticar a educação brasileira, que é uma merda!


2°) Não contesto o dever, determinado pela autorregulamentação publicitária e o CDC, da Nokia e de sua agência de explicitar que os vídeos se tratavam de propaganda. A questão não é essa, se você não entendeu isso leia o artigo novamente ou desista, problema seu.





terça-feira, 17 de julho de 2012

Buzinar pra quê?


Você vigia o relógio até dar a hora – os últimos minutos são os mais demorados. Quando o ponteiro maior alcança o 12 suas coisas já estão prontas e você já se levanta. Parte para o ponto de ônibus – É preciso se apressar para não perder o próximo. Depois desse, só vem lotado! Não que você vá sentado, mas nesse é possível embarcar. O pior, é que não faz diferença para onde você vai, o seu, sempre demora mais - todo ônibus passa rápido até você precisar dele. Outra verdade inquestionável é que ele estará cheio, exceto se você pegá-lo no terminal e, é claro, se aguardar na segunda fila, porque na primeira você irá em pé de qualquer modo.

Ok, você está no coletivo, mas como não tem metro de superfície, nem corredor exclusivo de ônibus o jeito é contar com o bom fluxo do trânsito da Reta da Penha (que agora é uma reta com curva) até a 3ª ponte (pela qual você ainda paga pedágio). Para um capixaba que mora na Grande Vitória não é preciso criatividade para imaginar essas cenas, elas são vivenciadas todos os dias.

Mas não basta ser espremido mais do que limão de caipirinha, nem suportar odores indescritíveis, ainda tem aquele sujeito (babaca) que pensa que ao apertar a buzina o carro dele se transformará em Optimus Prime e ele passará por cima de todos os outros carros que se aglomeram na sua dianteira e laterais. Não, não há nexo em buzinar enlouquecidamente enquanto se está em um congestionamento. Contudo, todos os dias existem mãos abençoadas que fazem isso!

Uma pequena demonstração diária do egocentrismo humano, pois se tivesse uma gota de altruísmo – para não dizer bom senso, notaria que todas aquelas pessoas em seus carros e transporte coletivo (quer pior que isso?), também estão cansadas de suas jornadas de trabalho, querem retornar aos seus lares, descansar. Muitas estão a caminho da sua segunda jornada do dia: escola, faculdade, curso. Logo, a buzina, que não melhora a situação em nada, a deixa ainda pior. Causa mais impaciência e irritação.

Ademais, fazer uso desse dispositivo sonoro – extremamente chato, de forma exagerada e sem motivo é infração pelo Artigo 41 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Pois sua função não é desabafar (descontando nos tímpanos alheios) sua raiva por estar preso em um congestionamento, mas advertir, COM TOQUE LEVE, ao pedestre ou motorista a fim de evitar um acidente. Mas essa é só mais uma Lei ignorada e transgredida pelos brasileiros – ôh, jeitinho de ser!

Melhor seria se todos aproveitassem para fazer algo útil neste tempo de espera. Coloque uma música legal, cante alto - quando não se tem opção, a melhor é relaxar. Converse um pouco com quem está no banco do carona, pense em outras coisas, que não o congestionamento que lhe atrapalha as atividades. Aprenda uma técnica de respiração e pratique no carro - durante o trânsito ruim heim! Se nada disso funcionar, olhe para o transcol ao lado e ponha-se no lugar daquelas pessoas, elas também estão presas no congestionamento, grande parte delas está em pé e espremida contra as outras, algumas exercitam o malabarismo - carregam cadernos, pastas, bolsas nas mãos e ainda se seguram, isso porquê, nenhum ser teve a bondade de ajudá-las e elas nem possuem uma buzina para apertar quando ficarem entediadas disso tudo. Então, por obséquio, para de apertar essa porra de buzina!




domingo, 15 de julho de 2012

O monstro da sociedade


Frankenstein - Interpretado por Boris Karloff
uma das mais famosas adaptações do romance, em 1931 

”Já tive esperanças de encontrar seres que, perdoando minha aparência, poderiam amar-me pelas qualidades que eu tinha dentro de mim.” 

Frase dita por uma personagem a quem muitos conhecem (nem que seja por meio dos filmes da sessão da tarde) e extraída por mim do clássico de Mary Shalley, a obra precursora da literatura de ficção científica, Frankenstein – Para tudo! Frankenstein não é o nome do monstro, mas do seu criador, Vitor Frankenstein. Caso você seja um dos que faz essa confusão. O monstro, que já foi representado de diversas formas no cinema, ora como um simples assassino sem capacidade de reflexão, ora como uma criatura trágica e extremamente articulada (a mais próxima do livro), na verdade, não tem nome.

Frankenstein é um dos livros mais adaptados para película e frames da história do cinema, porém, em muitas delas foi tratado com superficialidade, por meio de produções toscas que só criaram preconceitos quanto à obra literária. Pois, se concentraram apenas no aspecto assustador – na feiura do monstro - e ficcional da estória de Shelley, transformando-a em algo irrisório e até infantil (se souber de algum realmente fiel ao livro, por-favor, me indique). Entretanto, uma obra de literatura para ser considerada “um clássico” – como é o caso desta, precisa de muito mais que “sustinhos” e “caras feias” (e de vampiros que reluzem ao sol, é claro) foi esse pensamento que me levou a ler Frankenstein.

A estrutura deste romance é composta por três narrativas em primeira pessoa, do capitão que encontra Frankenstein à deriva, de Vitor Frankenstein e do monstro, o que confere à trama um ritmo que impulsiona à leitura, você quer continuar lendo, quer chegar ao final da estória sem ser interrompido – quase uma fissura! Além disso, esse formato coloca o leitor em cheque, faz com que ele enxergue ambos os lados da moeda, do criador e da criatura. Põe-no em dúvida sobre quem é o vilão e quem é o mocinho do enredo. Às vezes, sente-se pena de Frankenstein, por todos os flagelos que vive, em outro momento, o odiamos, e nos compadecemos pelo monstro, pela vida errática e solitária a qual foi lançado. Enquanto isso, o capitão representa o próprio leitor na estória – sou eu quem está ali, ouvindo tudo aquilo, querendo exterminar o monstro, desejando esbofetear o Criador e chama-lo de “idiota!”.

Logo de início, a autora nos mostra a fragilidade de Frankenstein, exibe á condição psicológica ao qual ele chegou, para mais tarde nos contar o que o levou aquele estado desesperador. Ela o humaniza ao ponto de fazer com que o leitor simpatize por ele e defina seu caráter positivamente, por intermédio do Capitão Walton e de sua descrição: “Nunca havia visto uma criatura tão interessante: seus olhos tinham uma expressão selvagem, quando não de loucura; no entanto havia momentos em que, se alguém lhe fazia alguma gentileza, toda a sua expressão se iluminava com um raio de benevolência e doçura inigualáveis.” em outro trecho “Deve ter sido uma nobre criatura em dias melhores, já que, mesmo agora, na desgraça, é tão gentil e amigável.”

Até que você conhece o relato do monstro, cuja ausência de nome reflete sua falta de identidade, a impossibilidade de ser reconhecido como alguém. A criatura e o que ela representa me remete ao que defendia o filosofo Rousseau – que por sinal nasceu em Genebra, cidade natal de Frankenstein e onde a autora criou seu romance, de que o ser humano é essencialmente bom, mas é corrompido pelo meio e as circunstâncias nas quais vive.

Na alegoria de Shelley, o monstro nasce ingênuo, ignorante a respeito de tudo. Tal qual uma criança, vai descobrindo aos poucos o que são as coisas e as pessoas (uma coisa, se é que você me entende). Ele se reconhece como individuo a partir do outro, é ao olhar para as pessoas e ao vivenciar a reação delas ao vê-lo – ficavam amedrontadas, fugiam ou atacavam-no, que a criatura descobre que é diferente e que, por isso, não é aceito.

Contudo, ele alimenta a esperança de que, se puder mostrar às pessoas suas qualidades – apesar de sua cara horrorosa, elas o amaram - Coitado! Desconhecia o preconceito e a discriminação humana, nossa incrível habilidade de amar o belo e o rico em detrimento de um bom caráter. Certamente ele não foi aceito e isso, no livro, determina os fatos que se seguem. Ele é uma vítima das circunstâncias, alguém que nasceu bom e tornou-se mau por tudo o que sofreu. Um subproduto da própria humanidade. Como muitos dos jovens brasileiros que se entregam aos vícios e a criminalidade e que, ainda, são tratados como problema individual e não social. “Serei sempre considerado o único criminoso, o único culpado, enquanto todos os que me conheceram cometeram injustiças para comigo?” diz o monstro.

Originalmente Mary Shelley deu um subtítulo ao livro, “Prometeu sem correntes”. Na mitologia grega, Prometeu criou a humanidade, a quem deu o poder de pensar e raciocinar. Enganou Zeus, roubou o fogo do Olimpo e deu-o aos seres humanos, para que esses sobrepujassem os outros animais. Por essa razão, foi condenado a permanecer preso por correntes junto ao alto do monte Cáucaso, durante 30 mil anos, durante os quais ele seria diariamente bicado por uma águia, a qual lhe destruiria o fígado. Como Prometeu era imortal, seu órgão se regenerava constantemente, e o ciclo destrutivo se reiniciava a cada dia. Após ser liberto por Hércules e substituído por outro ser imortal, o Minotauro, conforme regra de Zeus, esse lhe permitiu se tornar mortal e perecer serenamente. Um resumo metafórico da estória de Vitor Frankenstein.

Dessa forma, a estória criada por Shelley é uma daquelas obras que lhe confunde mais do que esclarece. É uma estória que nos acrescenta mais do que nos toma, que nos deixa contemplativos após a leitura, nos estimulando a refletir sobre as conjunturas sociais, sobre os métodos e dogmas humanos, sobre nós. Tudo isso, sob o pretexto do entretenimento. Uma obra completa, eu diria.

Mary Shelley. Biblioteca Nacional, Madrid
Mary Wollstonecraft Shelley (Londres, 30 de agosto de 1797 -— Londres, 1 de fevereiro de 1851), mais conhecida por Mary Shelley foi uma escritora britânica, filha do filósofo William Godwin e da pedagoga e escritora Mary Wollstonecraft. Casou-se com o poeta Percy Bysshe Shelley em 1816. Escritora de contos, dramaturga, ensaísta, biógrafa e escritora de literatura de viagens, mais conhecida por sua novela gótica Frankenstein (1818). (Fonte)


Saiba mais sobre a autora AQUI

sábado, 14 de julho de 2012

Ao avesso


É isto. Não sei bem como ocorreu, mas sei mais ou menos quando aconteceu. Aos poucos fui me coisificando, me desumanizando e se transformando em um subproduto de gente. Algo que se parece humano, mas na verdade é um vegetal indigesto, apenas com alguns sentidos a mais. Uma coisa que se move, caminha, fala, até pensa e sente, mas se acomodou de tal forma que simplesmente sobre-vive. De pouco a pouco perdeu-se a vaidade, a vontade de se por bela, de subir no salto e caminhar pelo mundo, de contemplar a vida e de tê-la pra si.

Não sei precisar quando, mas sei mais ou menos como. Uma mudança de endereço, alguns poucos, porém importantes, planos desfeitos. Autoexpectativas não correspondidas. Uma autonegligência aqui, outra ali. Autoflagelação silenciosa e imperceptível. Insônia, enxaqueca, falta de dinheiro, preguiça, e um sem fim de etcs. Pouco a pouco desisti de lutar por minha alegria, de brigar com quem se interpunha a ela. Com o tempo, fui fazendo as vontades alheias, disse um “não vou” hoje, outro “não posso” amanhã, um “não tenho tempo”. Não, não, não! Até que me tornei uma negação completa. Coisa que não faz ninguém feliz, que não se faz feliz.

Fui criando patas, pêlos, me tornando a metamorfose de Kafka que não pode sair do quarto. Enterrando-me em uma caverna e me amedrontando com as sombras em suas paredes. Não podia mais encarar a luz. O monstro de Shelley, desgraçado, raivoso, angustiado, sem par no mundo, sem refúgio, só. Um somente. A desordem exterior, na verdade, não é o reflexo da interior, porque essa é muito pior.

Quanto tempo perdido até que eu percebesse o processo. Enxergasse o emaranhado de cabos, cordas e fios que virou o meu ser, extensões de mim, fragmentos, peças perdidas de xadrez que não fecham jogo. Virei pedaços. Palavra cruzada que ninguém responde, charada que ninguém acerta, um porquê que ninguém é capaz de compreender. Porque tudo parece a mesma desculpa de sempre. “E desculpas nem sempre são sinceras. Quase nunca são.” Mas são desculpas que dou pra mim, não pra você. E eu as entendo, aqui é onde reside o problema. Só me resta o caminho inverso, mas para trás só caranguejo vai. É isto. Só falta a solução.



quarta-feira, 13 de junho de 2012

Feliz por si


Felicidade vem de dentro. Na época em que ouvi essa frase de um professor, ela me pareceu demagogia ou discurso de livro de auto-ajuda – tenho muito preconceito com esse tipo de literatura, ou seja, não lhe dei qualquer importância. Mas hoje compreendo e até concordo. É claro que os fatores externos influenciam, afinal, como não haveríamos de nos deprimir com a morte de um ente querido, com a reprovação em um concurso, com o relacionamento que finda, o grande amor que se vai, a demissão do trabalho ou o trabalho que não se encontra. Com todas aquelas fases em que o teto desaba sobre nós, ás vezes, literalmente.

Mas a verdade é que, mesmo que tudo esteja bem, que alguém nos diga todos os dias o quanto nos ama, o emprego seja bom, tenhamos grandes amigos e a faculdade o curso que tanto sonhara, se o “eu” não estiver bem com o “mim” nada mais fará diferença. O mundo pode chamar uma mulher de linda, porém, se ao olhar-se no espelho ela se sentir gorda, feia, magricela, baixinha, girafa e qualquer outro adjetivo ruim, nada fará com que ela se sinta bem de fato. Esse foi o exemplo mais fácil que encontrei, contudo, não se trata de beleza, mas de autoestima, de caber no próprio corpo, de reconhecer os próprios talentos, de permanecer bem quando se está apenas consigo.

Pois, sempre voltaremos para nós. Saímos para o trabalho, pagamos as contas, estudamos, bebemos, nos divertimos, passamos uma vida rodeados por outras pessoas, no entanto, ao final de um dia, durante a viagem no ônibus, na reflexão de fim de ano, em algum momento somos obrigados a nos encarar. Quando esse autoconfronto nos faz mal, não há culpado além de si.

Diariamente observo pessoas sentindo-se sozinhas, infelizes e acreditando que estão nessa condição porque precisam de alguém, daquilo que chamam de grande amor. Poder compartilhar a própria vida com o outro é muito bom sim, mas até para atrair esse outro, é preciso antes se amar. Caso contrário, surgem as doenças, a possessividade, o ciúme doentio, a sensação de que não sobreviveremos sem aquele outro. Na ânsia de não perder essa pessoa, terminamos por sufoca-la. Suplantamos assim o sentimento que poderia ter sido bonito. Termina-se só, consigo.



Pode soar bobo, mas mamãe sempre me ensinou que água de mais mata planta.

quinta-feira, 31 de maio de 2012

Entrevista com o artista Raphael Araújo



Raphael Araújo é graduado em Artes Plásticas pela UFES, 2011. Participou de diversas exposições coletivas, destacando-se “Deslocamentos”, na Galeria Homero Massena, 2008. Contemplado com a Bolsa ateliê de Pintura da SECULT, em 2010. Premiado com o primeiro lugar no V Salão de artes Levino Fanzeres, Cachoeiro de Itapemirim, 2010. Autor e diretor do curta-metragem "Confinópolis - A Terra dos Sem Chave". Confira abaixo, entrevista com o artista:


1) Raphael, conte um pouco sobre você e sua carreira artística. 
Sou nascido em Vila Velha e formado em Artes Plásticas pela UFES, 2011. Fiz algumas exposições coletivas, participei de uma residência artística voltada para pintura (2010), ganhei alguns concursos, participei de alguns projetos voltados para as artes. Desenvolvo trabalhos em diversas áreas como fotografia, desenho, pintura e vídeo. Atualmente estou fazendo alguns cursos na área do design, inscrevendo o filme Confinópolis em festivais, fazendo uma revista virtual (Underground do Underground ) e dia 06 abre a exposição “Multiplicação”, só de desenhos, juntamente com o artista Victor Monteiro, na Galeria Espaço Universitário, UFES e fica até final de Julho. 

2) Como surgiram as artes em sua vida? Sua paixão foi diretamente pelas artes plásticas ou outras linguagens como a música e o cinema também lhe impulsionaram?
Acho que um pouco antes da faculdade comecei a prestar uma maior atenção no que produzia e no que realmente queria fazer na faculdade. A essa altura eu tinha uma banda e pensava cuidadosamente (ao meu jeito) sobre as artes dos discos, dos cartazes, da divulgação. Nas férias me reunia com amigos e filmávamos alguns filmes trash por Vila Velha. Logo a música e o cinema me impulsionariam a fazer Artes.

3) Quais foram suas grandes influências? Houve algum movimento ou artista específico que lhe fez querer se tornar artista plástico?
As minhas maiores influencias em ordem cronológica foram os desenhos da televisão dos finais dos anos 80/ inicio dos 90, os seriados japoneses, os quadrinhos e os filmes dessa época. Anos depois, o rock, o skate e o punk, me influenciaram completamente tanto pela estética quanto pela filosofia e estilo. Através das artes e artistas relacionados ao punk como: Gee Vaucher, Jamie Reid, Winston Smith, Raymond Pattibon, Bob Gruen, conheci um pouco mais sobre a arte e seu mundo, identifiquei, vi neles e no que faziam algo bonito, importante, acessível, direto, agressivo. Na faculdade me aprofundei nos estudos sobre movimentos artísticos e logo vi que tudo estava relacionado. 

4) Com quais linguagens artísticas você atua?
Tenho interesse e me aventuro por alguns meios, dentre elas a fotografia, o desenho, a pintura, o vídeo.

5) O curta-metragem “Confinópolis – a terra dos sem chave” foi seu primeiro trabalho cinematográfico, como foi esse processo?
Foi o primeiro com um nível profissional, tendo em vista as antigas produções. Pela primeira vez iríamos trabalhar com verba, equipe, reuniões, roteiro, storyboard, edição de áudio-video, captação de som e muitas outras coisas que fazem parte da produção de um filme.

6) Seu trabalho com a fotografia contribui para a formatação de “Confinópolis”? Por que optou pelo preto e branco?
Sim, com certeza, fotografar me ajudou, até porque os conhecimentos são interligados. O fato de o filme ser em preto e branco, foram por diversas questões. A maior delas era manter a integridade e a fidelidade, dos quadrinhos, o máximo possível. Já que Confinópolis primeiramente foi concebido em quadrinhos, PB. O preto e branco também facilitaria na hora de captar e editar as imagens dispunha de poucos recursos. 

7) Por que transformar a HQ publicada na Revista Prego em um filme? Como surgiu a ideia?
Temos um grupo chamado “Camarão Filmes & Ideias Caóticas”, que teve o projeto aprovado no edital da Rede Cultura Jovem. Com a reativação do grupo começamos a fazer diversas reuniões e ficávamos cogitando o que seria interessante de filmar. Foi levantada no grupo a possibilidade de filmar Confinópolis, por possuir aspectos interessantes para ser transformado para o vídeo.  

8) Confinópolis é permeado por diversas metáforas e críticas sociais, como a manipulação do povo pelos políticos, religiosos e inclusive pela televisão (mídia). O objetivo da HQ e do filme, por conseguinte, era utilizar a arte como ferramenta de protesto e questionamento? 
Os objetivos da HQ, do filme e da arte para mim vão para além desses objetivos apontados na pergunta, eles surgem primeiro de um interesse pessoal em fazê-los. É minha maneira de se relacionar, reconfigurar, reinterpretar o mundo. Acho que o protesto e o questionamento estão dentro do ser humano. Só se mudam a forma de como isso é feito, os motivos. Confinópolis é fruto das minhas vivências por isso acho que se configurou desta forma, não que eu tenha pensado previamente que seria um protesto. Isso depende muito da interpretação de cada um. 

9) Acredita que hoje as artes ainda cumprem o papel de transformação social tal qual desempenharam alguns movimentos, como o Antropofágico?
Esta pergunta me parece um pouco complexa. E tocará em diversas questões duvidosas. Eu não sei definir e nem onde me basear para afirmar se a arte transformou socialmente o mundo. Acredito que ela pode ajudar, ela geralmente aponta caminhos. Mas não se pode isolar ela do restante da sociedade, ela é fruto de tudo esta acontecendo no momento. 

10) A produção de cinema no ES ainda é frágil e está começando a despontar algumas obras em nível nacional e internacional. Como você enxerga esse cenário no Estado? O que ainda falta para desenvolver o cinema capixaba?
Eu enxergo o cenário do estado em plena ascensão. Isso acontece por alguns motivos, o acesso facilitado de hoje à tecnologia e as politicas públicas dos últimos anos, voltadas para o desenvolvimento deste setor. Apesar de ainda serem poucos os investimentos, esta se investindo. Acho que é preciso tempo e com isso ganhar experiência. Às vezes falta uma maior profissionalização. Apesar das dificuldades vejo as produções capixabas equipararem-se as produções dos demais estados. 

11) Confinópolis foi assistido em diversos festivais de cinema, como a 9ª  FEIRA LAICA Internacional, VIII Fantaspoa - Festival Internacional de Cinema Fantástico de Porto Alegre  e 2º CINERAMA.BC - Festival Internacional de Cinema em Balneário Camboriú 2012, porém ainda não foi exibido em cinemas do ES. Podemos esperar por isso em 2012?
Não foi assim diversos, você disse todos os festivais em que filme participou. Futuramente o filme será exibido no Fest.pt – Festival de cinema jovem, que fica em Espinho, e também na 20ª feira Laica que fica na cidade do Porto, ambos em Portugal. O filme só foi exibido no ES, em duas sessões piratas, uma na Casa 16, em Vila Velha e uma na Fogueirinha Vibe, na UFES. Eu espero que ele seja exibido em algum cinema do ES, ainda este ano.

12) Como as pessoas podem assistir “Confinópolis – a Terra dos sem chave”? 
O filme esta na internet e só não é liberado, pois isso poderá prejudicar o filme a passar em algum festival, alguns exigem ineditismo. Liberamos por algum tempo para uma entrevista, mas com senha, sempre passamos o link para as pessoas que querem assistir, junto com a senha. Podem me pedir rapharaujo@gmail.com, que farei isso. Outra forma é que mandamos para a fábrica o DVD do filme, estaremos vendendo ele para quem quiser. Ele será comercializado separadamente ou com uma máscara do filme. Para quem se interessar entre em contato. Espero que o filme, ainda este ano, seja exibido no ES, de uma maneira mais ideal.

terça-feira, 29 de maio de 2012

O machismo e outras verdades incontestáveis


Não me impressionaria com um passageiro que escandaliza o fato de uma mulher pilotar o avião, nem com os homens que ainda afirmam que as mulheres preferem carros ao invés de pênis, se esses (pré)conceitos não tivessem a mesma motivação dos fatos e índices apontados pelo site Quem o machismo matou hoje? As diferenças entre homens e mulheres existem e quem afirma o contrário ou é machista ou é iludido. Infelizmente a maioria se enquadra no primeiro grupo. As mulheres ainda hoje são tratadas como propriedade do homem, caso contrário, como justificar os conceitos de que “o menino pode” a “menina não”, a sociedade é fálica, desde a criação de seus filhos até seus monumentos históricos. 

Quando nascia a menina era propriedade do seu pai, após o casamento pertencia ao marido, a quem devia total obediência, não lhe sendo possível se quer recusar o coito. Por séculos foi referência de pecado, sendo considerada pela cristandade como impura e por isso merecedora de toda sorte de flagelos. Justificativa semelhante foi dada pelos sacerdotes católicos à escravidão, os negros deviam ser capturados, torturados e postos em condições animalescas, pois não possuíam alma, haviam vendido - a ao demônio e a única forma de redenção era a tortura, física e psicológica. Hitler também utilizou argumentos semelhantes, na sua busca pela raça pura, por territórios e outras coisas mais, cometeu genocídio, que com essa palavra tão pequena nem parece ter sido tão atroz, mas foi. As ditaduras seguiram linha similar para livrar a sociedade dos ameaçadores da honra, da dignidade e da família cristã, os socialistas. Não me atenho às questões políticas e econômicas motivadoras desses “líderes de movimento”, mas sim ao belíssimo discurso usado por eles para convencimento e manipulação da sociedade. 

O fato é que o machismo, tal qual o racismo e a homofobia, estão enraizados na conjuntura social, presentes nas piadas, charges, chavões, falas que, muitas vezes, são ditas e replicadas sem que seu disseminador se dê conta do que ele está passando adiante. Sem que a pessoa perceba que o que ela diz vai ao encontro de homens que batem e até matam suas companheiras porque essas optaram pela separação (pois eles são donos de SUAS mulheres e só eles podem decidir quando largarem-nas), dos chefes que assediam suas funcionárias (pois é normal de macho fazer isso), de homens que abusam e estupram (porque a mulher provoca com sua roupa decotada, curta e colada no corpo), afinal, mulher não é gente, é um subproduto do homem. Ademais, é óbvio que a vítima é a culpada pelo crime, o homem é um animal instintivo que não responde por seus atos, logo, as fêmeas não devem provocá-los. 

Devemos desde cedo ensinar nossas filhas que, antes de escolher suas roupas elas precisam analisar se elas não atraírão um animal carnívoro e tribal chamado homem; antes delas definirem onde ir e que horas retornar para casa, elas precisam refletir se esse local e horário não correspondem ao habitat natural do macho; antes de se apaixonarem e constituírem uma nova família elas necessitam se conscientizar de que essa decisão não tem volta, que elas não podem mudar de ideia, haja visto que pedir o divórcio é justificativa plausível para ser assassinada. Devemos, ainda, ensinar aos nossos filhos que seu “piruzinhos” são o cetro do poder que domina o mundo, que eles podem tudo e que se uma mulher ousar desobedecê-los e provocá-los com suas vestimentas consideradas inadequadas eles devem utilizar toda sua força para corrigi-las.

Mas não, o machismo não existe, nem aqui e nem no Oriente:  



domingo, 20 de maio de 2012

Aqui se faz Literatura

*Artigo publicado no Caderno D ano II - n° 8, Fevereiro de 2012

A literatura é uma manifestação artística que, tal qual as artes plásticas, é constituída por distintas Escolas, no Brasil, por exemplo, compreende do Quinhentismo ao Pós Modernismo. Logo, se referir a uma “literatura capixaba” é presumir equivocadamente que a produção literária regional independe da literatura brasileira, apesar dessa ser única. Pois o que existe é literatura produzida por autores capixabas, natos ou adotados. Cujo início se deu com os autos escritos por José de Anchieta, no final do século XVI. Desde então ocorreram diversas mudanças, que oscilaram entre fases de pouquíssima produção, como os séculos XVII e XVIII, restritos a literatura de louvor a Nossa Senhora da Penha, e de franco desenvolvimento, como o século XX, marcado pela criação de importantes instituições ligadas à literatura, o Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo e a Academia Espírito-santense de Letras, ambas ainda atuantes, além do lançamento da Revista Vida Capichaba, que contribuiu por quase quatro décadas para a cultura regional. Em meados desse decênio, autores capixabas já despontavam em âmbito nacional, como Haydée Nicolussi (1905-1970), poetisa brilhante, lembrada por Graciliano Ramos em Memórias do Cárcere, e Rubem Braga (1913-1990), reconhecido como um dos melhores cronistas do país.

São muitos os autores que merecem citação, porém, não cabem todos nesta revista, entre eles estão Renato Pacheco (1928-2004) pioneiro na publicação de romances modernos, Fernando Tatagiba (1946-1988) e Bernadette Lyra, os dois precursores do conto capixaba moderno e, dos anos 1980, Reinaldo Santos Neves, Adilson Vilaça e Francisco Grijó, fundamentais no gênero de ficção em prosa, assim como Paulo Roberto Sodré, Sérgio Blank e Oscar Gama Filho, para a poesia. Os próximos decênios se configuraram pelo reconhecimento e valorização do capital social e, concomitantemente, pelo estímulo à cultural, através de Leis de incentivo, como a Lei Rubem Braga da Prefeitura de Vitória, e de Editais, como os da Secretaria de Cultura do Estado e o mais recente Bolsa Cultura Jovem, que viabilizaram o surgimento dos novos autores, como Saulo Ribeiro, Gladson Dalmonech, Caê Guimarães e Erly Vieira Junior, para citar alguns.

Contudo, falta ao cenário literário espírito-santense um sistema eficaz de divulgação e comercialização das obras, a dificuldade não é mais o processo de produção e publicação do livro, mas a formação do leitor e o acesso dele às obras, visto que elas permanecem por pouco tempo nas livrarias, muitas vezes, nem chegam até elas, sendo vendidos apenas no lançamento ou de boca-a-boca, por seu autor, como faz Aline Dias, que sempre leva na bolsa o seu primeiro romance, intitulado Vermelho, para oferecê-lo aos que encontra, sendo assim, escritora e propagandista.

Leia todos os artigos do Caderno D n°8 e conheça mais da cultura capixaba

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Sem manual

Deveríamos nascer sabendo como dar conta de tantos compromissos, prazos e cobranças.
A vida é injusta! Ninguém nos avisa na infância, para aproveitar a lama, os pés descalços, o brinquedo quebrado, a árvore no quintal e o balanço de pneu. 

Tudo o que nos falam é:
- Não suje sua roupa menina, sou eu quem lavo! 
- Desça daí, você vai se machucar!
- Calce os chinelos, para não ficar gripada!

Infância deveria ter aviso prévio, 30 dias para nos prepararmos, conscientemente, para o terror da adolescência. O corpo que não cabe na roupa, a mente que não corresponde ao corpo, o corpo que não se cabe. Nada se sabe, nem se é adulto ou criança. 

E antes dessa fase tenebrosa – que adiante será motivo de saudosismo – finde, seria preciso um tratamento intensivo, a terapia do “agora você cresceu!”. Com direito a professor de programação neurolinguística, que nos ensine a como se portar, em si e no mundo. Um economista, que impeça o deslumbre do 1° salário, os gastos desenfreados e, por conseguinte, o sentimento de “não conquistei nada de útil para mim!”. Além disso, um especialista em gestão pessoal, que nos faça colocar nossa vida em planilhas do Excel, quadros kanban e projetos do MS Project. Ah, é claro, e um psicólogo comportamental que nos adestre para colocar em prática tudo o que os outros profissionais nos ensinaram. 

A vida deveria ter manual e todos deveriam aprender desde cedo que os manuais são importantes e que se não o ler possivelmente algo sairá errado. 




terça-feira, 15 de maio de 2012

Desejo



Não importa quão louco seja meu comportamento
quão escandaloso seja meu riso
quão desenfreado seja meu sentimento
quão limitado seja o meu juízo
O importante é que vivo!

Se me entorpeço ou não
Se vou ou se fico
Se minto ou digo a verdade
Ando mesmo na contramão
da sua divina seriedade

Quero todas as emoções em prato fundo
Quero todo amor do mundo!
Quero beijos cálidos
E a vida em um envelope

Quero nadar em mar bravo
Sair de casa em dias de tempestade
Repousar em lago sereno quando me der vontade
e encontrar sombra nas tardes de verão

Eu quero
e quero agora!
Não importa se estão olhando
Não quero pudor
Nem pejo
Quero desejo desenfreado e inconsequente

Quero o infinito
dispenço limites, já me basta os que criei
Irei além, até onde eu me permita
Superar a mim, é superar tudo.


segunda-feira, 14 de maio de 2012

Modernidade, viva!


 Homens voando sem asas
Fábricas de xérox humanas
Indústrias mais industrializadas
O azul é agora cinza

Rios urbanos,
Lixão aquático
Rios secando
Arvores caindo
“-Tudo em no do progresso!”

Já não existe Jesus Cristo

Há apenas o consumismo

O monte Everest se oculta nas sombras dos arranha-céus
O panda não esta extinto
“-Saiu de mudança da China e da Índia para o quarto das crianças.”


Progresso inverso,
Rumo a idade da pedra!
O êxtase do orgasmo é agora inalado, fumado ou injetado.
A gosto do freguês!
Não é preciso Montéquios nem Capuletos para um final drástico

Filhos sangram pais, pais desonram filhos.
Padres pedófilos, pastores comerciantes de fé.
Muçulmanos chacinam por Alá.
 E os judeus... Bons negociantes.
Ah! E os Rastafaris?! Só mesmo Marley.

Alegrem-se irmãos, este é o novo mundo!


sábado, 12 de maio de 2012

Menino de rua



Obstruo sua travessia
fazendo do meio-fio moradia
Vejo seu vulto soberbo
tornando-me um defunto sem peso

Sou envolvido por uma serpente,
um veneno entorpecente,
brincando com as miragens
em minha mente

Fora do transe químico,
pesadelo real, doloroso suplício.
Tenho fome, não tenho comida.
Tenho sede, não tenho bebida.

Mas tenho a química dos homens,
a hilariante cola dos solados.
A paisagem que não é quadro;
O sentimento que não é poema.

A verdade nua e crua, a cada passo nas ruas.

Jacob O. Bittencourt
















sábado, 5 de maio de 2012

Mergulhe nestas ondas


Roteiro| Pesquisa: Jocilane Rubert
Direção de arte| Edição: Wanderson Scofield

Nas ondas do rádio o Programa Jairo Maia - PJM - navegou por meio século. Líder de audiência das rádios AM no Espírito Santo, o radialista realizou grandes mudanças que influenciaram seus sucessores e, inclusive, outros veículos de comunicação, como os programas televisivos.“Com 60 mil ouvintes por minuto, segundo dados do Ibope” sua história se mistura à de inúmeras pessoas e famílias.

Pela primeira vez no Estado, uma atração de rádio recebeu ligações ao vivo dos ouvintes, tirando definitivamente o locutor do papel de anunciante musical, para assumir o posto de apresentador do programa, e transformando o ouvinte em um agente ativo que, além de ouvir, também fala. Assim, Jairo Maia permitiu a criação de vínculo entre ele e aqueles que o escutavam, em suas palavras “ele era a ponte entre os que precisavam de ajuda e os dispostos a ajudar”.

Moradores de diversas regiões publicavam por telefone suas queixas sobre a comunidade, enquanto o radialista contatava a autoridade competente, e essa dava seu parecer referente à reclamação, haviam outros quadros nos quais era estimulada a interação do público, tais como o "Show do Quebra-Cuca”, onde o ouvinte respondia à perguntas conhecidas como charadas, quando ele acertava era premiado, o "Troca-Troca" onde se anunciava gratuitamente produtos e serviços para vendas e trocas e a "Corrente de Oração pela Família”, aberta para solicitar orações. Com treze sessões em um único programa a canção terminou por ficar em última instância exceto, é claro, pelo quadro “A música da minha vida”, onde o espectador pedia uma canção relacionada com sua história pessoal.

Nesse panorama, Jairo Maia foi o precursor de um modelo de comunicação que passou a ser utilizado por diversos veículos, tanto o rádio, quanto a televisão e o jornal impresso. Cuja audiência é obtida, em grande parte, através do espaço concedido ao público. A partir do Programa Jairo Maia a mídia local descobriu que “ganha mais, quem mais escuta”, como afirmou Jairo Maia em entrevista, se constatou que as pessoas não querem apenas ser a noticia, mas sim fazê-la. O jornalismo capixaba deixou de ser apenas fonte de informação e se transformou em um espaço de publicações de denúncias, por meio do qual é possível levar à luz, situações precárias que nunca seriam conhecidas se não houvesse um meio de comunicação amplo que as divulgasse.




Jairo Gouvêa Maia nasceu em Bom Jesus do Norte, Município de Cachoeiro de Itapemirim, iniciou sua carreira em 1957, cobrindo as folgas de outros locutores da rádio ZYL-9, na qual estrearam os músicos Sérgio Sampaio e Roberto Carlos. Em 1961 trabalhou na Rádio Espírito Santo, depois na Rádio Vitória, posteriormente na Rádio Capixaba, que foi comprada por ele, porém, após quatro anos a rádio não obteve sucesso e então ele regressou à Rádio Espírito Santo e depois foi para a Rádio Gazeta. Onde foi criado o Programa Jairo Maia, que a princípio seria um programa de música transmitido às 15h. Ele permaneceu na Gazeta por quase vinte anos, da qual saiu por se sentir desvalorizado e por ter perdido uma hora de seu programa para o “Momento de Fé” do Padre Marcelo Rossi.


sexta-feira, 27 de abril de 2012

Entrevista sobre o Assédio Coletivo



O Assédio Coletivo é um coletivo artístico formado por bandas e produtores culturais com o objetivo de fortalecer o cenário cultural da Grande Vitória e do Espírito Santo.

Confira minha matéria sobre coletivos artísticos na coluna Múltiplas Manifestações do Portal Iuuk


1. A partir de qual demanda surgiu o Assédio Coletivo? Conte um pouco sobre a sua criação.
O Assédio Coletivo surgiu da demanda de três gargalos aqui do nosso estado:

- falta espaço para as bandas de música autoral se apresentarem
- falta de formação de público das bandas autorais
- profissionalização das bandas

Esses três fatores acabam por se tornar uma bola de neve, um vai tornando o outro cada vez maior. A busca do Assédio é tentar solucionar/minimizar esses gargalos. No Brasil inteiro hoje temos bandas de destaques em todas as regiões e o Espírito Santo tem eventos pontuais em que as bandas daqui se apresentam, mas as bandas de médio e pequeno porto não tem espaço. Criamos então um festival mensal, o Festival Tarde no Bairro, no qual as bandas podem se apresentar, somente com músicas autorais, e acertar os detalhes que faltam na banda, conquistar o público e conquistar mais espaços para apresentações.

Além do Festival, possuímos uma reunião semanal, na qual trocamos informações e opiniões a respeito do desenvolvimento das ações do coletivo, as bandas trocam informações técnicas entre si para melhorar os shows e acaba por ser um espaço muito rico a respeito do cenário musical e cultural, existem integrantes do coletivo com 2 anos de trabalho e integrantes com 10 anos de trabalho.

2.  Vocês contam com quantos integrantes? Como foi/ é o processo de inserção de pessoas ao Assédio Coletivo? A equipe atual é a mesma desde o início?
Atualmente o Assédio conta com um cadastro de mais de 50 bandas além de fotógrafos, artistas, expositores, produtores, técnicos e uma lista de parceiros de serviço. Temos dois meses e alguns dias de formação e nossa equipe já evoluiu bastante. No início éramos 4 cabeças, com 3 bandas envolvidas, tentando correr atrás e montar o festival. Hoje já conseguimos mobilizar os integrantes de várias bandas e também artistas que não tem espaço para expor seu trabalho.
O processo de integração ao Assédio é simples, basta o interessado começar a frequentar nossas reuniões e vai se integrando ao movimento. É importante ressaltar que não somos uma produtora. Produzimos eventos para que os grupos artísticos que integram o coletivo existam e alcancem uma formação de público e uma profissionalização adequada, mas nosso objetivo é muito maior do que apenas produzir eventos. É fazer a população perceber que a produção capixaba existe, e é de qualidade. Que a nossa cultura está sem espaço no lugar onde vivemos e se não fizermos nada, ninguém fará por nós. Por isso incentivamos as nossas próprias produções, de forma completamente independente, cada um corre atrás para ajudar o grupo, e não a si mesmo. Temos consciência de que juntos formamos um movimento muito maior.

3.  A expressão artística com a qual o Assédio atua é apenas musical? Existe a pretensão de integrar outras formas de arte?
Inicialmente começamos com a música porque era o ramo das pessoas que integravam o Assédio, além de saber que a música poderia ser o objeto propulsor do nosso movimento. Hoje nós já estamos dialogando com artistas plásticos e visuais, fotógrafos, artesãos e qualquer artista que sejam interessado em expor o seu trabalho. Há muitas produções de qualidade ainda escondidas pois os artistas não tem onde expor. Resolvemos isso com as exposições durante o Festival Tarde no Bairro, que aos poucos está se tornando um festival de artes integradas. Não há restrição para gêneros artísticos, há espaço para todos, é só conversarmos para sabermos a melhor forma de expôr os trabalhos de cada um.

5.  Fale um pouco sobre o Festival Tarde no Bairro. 
Identidade visual: JUUZ Design
O FTNB é uma iniciativa para que possamos lutar contra esses gargalos que eu citei. É um espaço de circulação cultural, no qual você reúne seus amigos e sua família. A opção de escolher o horário da tarde para sua realização é para facilitar a circulação e integração de pessoas de todas as idades, além de aproveitarmos um horário em qua nada mais acontece, por enquanto, na cidade e evitarmos transtornos de horário com o transporte público, o evento acaba entre 20h e 21h. Ainda dá para curtir a noite em outro local. Além disso, existem pais que gostariam de ir a lugares como esse para aproveitar um evento cultural com os filhos, e um evento a tarde é a melhor opção, tem espaço para as crianças andarem de bicicleta, skate e jogarem bola. Estamos construindo um local de interação, deixamos sempre um local reservado para a expressão artística dos participantes - folhas em branco e lápis de cor, assim os pais podem aproveitar para fazer atividades criativas com seus filhos, e de quebra ouvem uma boa música.

O Festival é produzido pelas bandas e artistas que integram o coletivo. A ideia é que le parta para outros bairros. Hoje ele acontece mensalmente em Bairro República, mas já conseguimos três datas em Araçás, Vila Velha. Queremos que o festival migre sim para outros bairros, através das bandas e dos artistas espalhados pela cidade. Já temos um modelo, mas cada um deve aplicá-lo de acordo com a necessidade do seu bairro. Queremos que outros municípios tomem conhecimento do festival e da forma coletiva de trabalho. Cariacica, Cachoeiro do Itapemirim, Guarapari e Santa Teresa, são municípios em que bandas e artistas já demonstraram interesse em participar e conhecer a iniciativa. Sabemos que cada bairro, município e região tem seus artistas e músicos e é dessa forma que queremos trabalhas, com os talentos locais de cada região. No mais, mesmo que a pessoa ainda não seja músico ou artista, estar dentro do coletivo possibilita que ela aprenda algum tipo de atividade, faça parte da produção do festival e conheça essa produção de cultural local.

6.  Como o coletivo se sustenta?
Buscamos patrocínios com empresas e nos escrevemos em editais públicos. Escrevemos um projeto base, o qual adaptamos para cada parceiro que queremos ter ao nosso lado e a cada edital. Além disso contamos com a pequena renda do bar do festival e da venda de rifas durante o festival, sorteamos brindes de produtos conseguidos juntos aos parceiros.

7. Como foi prospectar parceiros para o Festival Tarde no Bairro? Conte um pouco sobre os parceiros e a forma como colaboraram com o Coletivo.
A captação sempre é a parte mais difícil, falta um entendimento por parte das empresas do que é esse investimento em cultura e por parte dos artistas em valorizar o próprio trabalho. Chegamos sempre oferecendo algo em troca da ajuda do parceiro, seja espaço em nossas mídias ou o catálogo de contatos que temos. Fazemos trocas dentro das nossas possibilidades. Com isso estamos conseguindo um catálogo de serviços com desconto, que ficam disponíveis para os integrantes do coletivo, conseguimos materiais gráficos e design, programas de rádio parceiros, enfim, várias coisas. As pessoas estão começando a entender que essa criação de espaço para apresentações e valorização da nossa cultura é benéfico para todos os envolvidos.

Entrevista sobre o Coletivo Expurgação

Foto: Tiago Rossman
Entrevista com Raphael Gaspar e Lorena Louzada, integrantes do Expurgação, coletivo de artistas fundado em 2007 que propõe a expansão da consciência cultural, através do site http://expurgacao.art.br/ e de ações que beneficiam a experiência idealista. (retirado do site)





                         



1. O Coletivo Expurgação começou no campus universitário através da união de amigos, mas como surgiu a ideia de se constituir um coletivo artístico? Conte-nos um pouco sobre o processo pelo qual passaram para estruturar o Expurgação.
Ao contrário da origem ideológica criativa, o Coletivo surgiu através de ações concretas como sessões musicais, pesquisa coletiva e algumas reuniões despretensiosas. Portanto, uma antiga república, a UFES e o Sítio Javali foram os lugares que permitiram nossa convivencia e, por conseguinte, nossa percepção de grupo. Isso aconteceu de 2003 até 2007, quando finalmente decidimos investir na criação de um coletivo.

2. Hoje vocês contam com quantos integrantes? Como foi/ é o processo de inserção de pessoas ao Expurgação? A equipe atual é a mesma desde o início?
Hoje contamos com 15 integrantes. Esse processo se iniciou por meio de substantivos intangíveis: afinidade, simpatia e amor, mas depois se consolidou através do interesse profissional de trabalho em equipe, uma vez que nos graduamos em áreas que se interceptam. Nossa equipe começou com 18 integrantes, mas com o tempo percebemos quem queria apenas uma zona de convivência livre e quem realmente queria arriscar um empreendimento. Colocamos as cartas na mesa e chegamos a conclusão de que o Coletivo Expurgação é nossa formação imaterial relacionada com experimentação, pesquisa e cultura. Sendo assim, criamos a Kalakuta, que é a parte material (o empreendimento e a nova sede) que dá sustentação as ações da Expurgação.


Foto: Francisco Neto
3. Vocês contam com profissionais de diversas áreas, designers, artistas plásticos, entre outros, como se dá o processo de criação com tantas linguagens artísticas envolvidas? A equipe toda participa de todos os projetos ou esses são delegados a pequenos grupos, conforme sua linguagem de atuação?
Sempre coletivamente, de acordo com o princípio de divisão de tarefas. Não temos hierarquia dentro do Coletivo, porém, atribuímos funções e tarefas para a equipe em cada projeto ou para as necessidades administrativas da Kalakuta - essas tarefas são cobradas por todos os envolvidos. Dentro do Coletivo sabemos quais são as técnicas dominadas por cada integrante, de modo que para a elaboração do processo criativo contamos com o suporte de cada especialista, ou de parceiros fora da Expurgação. Por fim, trabalhamos interdisciplinarmente visando a experimentação, o aprendizado e a capacitação consciente.


4. Como o coletivo se sustenta? 
Através de trabalhos culturais (Editais, leis de incentivo, licitações) e particulares da iniciativa privada. Uma porcentagem desses trabalhos vai para a Kalakuta, além disso, seus integrantes pagam uma mensalidade que varia de valor conforme o fluxo de trabalho do período.


5. Hoje vocês prestam serviço ao mercado, que tipo de serviço é esse? Qual público vocês atendem?
O coletivo se apresenta para o mercado através da produtora Kalakuta oferecendo serviços de vídeo (roteiro, storyboard, produção audiovisual e séries para cinema, TV e internet, iluminação, captação e edição de imagem em Full HD, efeitos, animação / motiong graphics), áudio (composição de trilha sonora para filmes e comerciais, produção musical, gravação em estúdio ou externa / som direto e pós produção), design (criação de identidade visual, editoração de livros, ilustração), fotografia (Publicitaria, Moda, Institucional, Arquitetura, Editorial).

Esses trabalhos, mesmo com caracter comerciais, são desenvolvidos pelos membros do coletivo expurgação, que também conta com outros projetos que podem ser apresentados, exibidos e comercializados, como as bandas Fepaschoal, Santiago Emanuel, Expurgação, a exposição de artes visuais Expo Javala, a mostra audivisual Cine Expurga e os livros e documentários dos Últimos Refúgios.

Com isso, atendemos agências de publicidade, produtoras, produtores independentes, músicos e orgãos e instituições públicos e privados com algum tipo de interesse na produção de material artístico e cultural.


6. O Expurgação colabora de algum modo com outros coletivos e artistas independentes? Se sim, como se dá essa parceria?
Sim. A parceria só depende de uma oportunidade, seja ela na música, nas artes ou no design. Aparecendo um projeto que necessita de colaboração, entramos em contato com nossa rede, que sempre responde de forma positiva, equilibrando cada parceria com a demanda do momento. Também existem projetos externos, e assim é feita a parceria ou colaboração, pela aproximação das fontes criativas.


Foto: Francisco Neto
7. O álbum Noaretério, lançado virtualmente e disponível para download livre, no último ano foi lançado também fisicamente, durante o Grito Rock. Porque optaram por lançar a versão física do álbum? O mercado fonográfico ainda percebe a internet e o download como obstáculos ao desenvolvimento, mas vocês, aparentemente, utilizam, a internet a favor do trabalho que desenvolvem, como ocorre isso? 
As pessoas sentem necessidade de possuir objetos. O sistema dos objetos (Baudrillard, 2000) permite a re-significação de objetos e signos culturais, por exemplo, a embalagem desse álbum foi feita com restos de papelão e aplicações serigráficas, fato que o diferencia dos tradicionais modelos de embalagem de cd's. A internet é um território cheio de entrelinhas. Se por um lado ela pode oferecer risco ao conteúdo protegido por lei, por outro lado permite a ampla divulgação de trabalhos ainda desconhecidos e renova o processo de interação entre artista e público.


8. Qual a visão do Expurgação a respeito do mercado fonográfico x distribuição livre?
O mercado fonográfico foi pego de surpresa pelas mudanças provocadas pela internet - já o mercado cinematográfico trava uma batalha contra a distribuição livre. Sendo assim, consideramos que a distribuição é uma questão de estratégia do artista independente ou da gravadora. Para as gravadoras a liberdade é sempre um mau negócio, quanto maior o controle maior poderá ser o lucro. Mas para o mercado independente a liberdade é uma característica intrínseca que não pode ser ignorada.

Atualmente o coletivo desenvolve o site expurgacao.art.br com apoio da Secult/ES alimentado por conteúdos sobre assuntos gerais, divulgação e registro das ações as quais o coletivo estiver envolvido.

sábado, 21 de abril de 2012

Manifesto animal

Jamais, nunca, em tempo algum compreenderei como um ser, que se diz humano, é capaz de maltratar outro que além de sofrer e sentir dor, é tão lindo e inocente! Não vejo sentido em causar qualquer sofrimento gratuito a outro ser vivo, por mero prazer e satisfação pessoal. Sim, só pode ser por prazer. Pois uma pessoa que não se sente feliz com a dor alheia jamais teria estômago, coração e ímpeto para maltratar, torturar e espancar um ser que grita, agoniza e pede socorro enquanto sofre. Um ser que, muitas vezes, recebeu algum carinho da mão que antes acariciava, os próprios donos.

Por isso não gosto e não uso a palavra “dono”, não sou dona de ninguém além de mim. Não sou dona de mãe, irmão, marido, amigo ou namorado. Não sou dona de gente e não sou dona de bicho. Sou tutora de animais. Ser tutor não é ter posse. Tutor é aquele que cuida, protege, defende e ampara. Se não quer ser mãe, não tenha bicho de estimação. Mas não tenha mesmo! Gato, cachorro, peixe, pássaro, periquito e nem papagaio. Apenas, pura e simplesmente, não os tenha.

Verbo ter não se conjuga com amar, não cabem em um mesmo período, não possuem coerência, nem coesão, parágrafo com essa associação perde o nexo, o texto perde argumento e fica sem a conclusão. Pois quem ama a esses seres (que são tão vivos quanto os humanos!) sabe que é do pássaro o céu e do peixe o mar, que se pode ouvir o canto do passarinho nas árvores do quintal, no parque da cidade, em uma reserva florestal ou até em um cd. Com tanta música boa para se ouvir não há sentindo em se aprisionar um bichinho por essa razão. Ainda mais se esse pequeno poderia ter o céu ao seu dispor. O mesmo vale para os peixes, ter rios e oceanos inteiros como lar e ser obrigado a se contentar com um retângulo. Pura inveja humana! Inveja de quem não possui asas, nem guelras.

Pobres cães e gatos, pior estão. Eles foram acostumados ao homem, domesticados, e assim se entregam, confiam e pouco precisam em troca. São ainda mais vulneráveis. Expostos a crueldade de quem deveria defendê-los, ao menos respeitá-los. Não sou contra quem não ama os animais. Amar alguém é individual, mas não amar não é sinônimo de direito de infligir dor. Pelo contrário, é motivo para se manter distante. cada um no seu espaço, gato/ cachorro para um lado, gente para o outro. Isso já bastaria.


quarta-feira, 11 de abril de 2012

Entrevista com José Roberto Santos Neves


Nascido em Vitória (ES), em 1971, José Roberto Santos Neves é Jornalista pela UFES, com pós-graduação em Gestão em Assessoria de Comunicação pela Faesa. Trabalha no jornal A Gazeta desde 1994, atualmente como editor do Caderno Pensar, anexo sobre cultura veiculado aos sábados. É o criador da página Fanzine, que circulou entre 1995 e 2011 nesse mesmo jornal. Como baterista, gravou os CDs "Hidden Melody" (1994), da banda The Rain, e "Todo dia é dia de blues" (2003), da Big Bat Blues Band. É autor dos livros "Maysa" (2004), a primeira biografia da cantora Maysa, e "A MPB de Conversa em Conversa" (2007), e agora autor do livro prestes a ser lançado “Rockrise - A história de uma geração que fez barulho no Espírito Santo”. 

Confira, abaixo, a entrevista com o autor:

1. O senhor já escreveu dois livros relacionados com a música, "Maysa" (2004), a primeira biografia da cantora Maysa, e "A MPB de Conversa em Conversa" (2007), ambos com contexto nacional, mas no próximo dia 19 lançará o livro “Rockrise - A história de uma geração que fez barulho no Espírito Santo” que nos conta a história do rock autoral produzido na Grande Vitória. Por que escrever um livro sobre o rock capixaba e de um período tão específico, dos anos 60 até 1995? Nos conte um pouco sobre o livro “Rockrise - A história de uma geração que fez barulho no Espírito Santo”.
R.  A ideia de escrever este livro é antiga, mas só agora consegui transforma-la em realidade. O foco gira em torno dos anos 80, a década do rock and roll no Brasil, marcada pelo Rock in Rio I (1985), a geração de Brasília, a explosão das bandas do Rio e de São Paulo, a estratificação da juventude em tribos urbanas (metaleiros, punks, góticos, new wavers) e a legitimação do rock como trilha sonora da Nova República, após 21 anos de ditadura militar. Parti da percepção de que o Brasil conheceu a cena roqueira de várias regiões, porém o rock produzido no Estado permaneceu escondido por uma série de fatores, embora bandas talentosas tenham se formado em Vitória e nas cidades vizinhas. Para contar as cenas dos anos 80 e 90, que tiveram grande cobertura da imprensa local, tive de voltar no tempo e resgatar os pioneiros que desbravaram esse caminho, inicialmente seguindo o modelo da Jovem Guarda e dos Beatles (The Jet Boys, The Bats, Les Enfants, Os Infernais) e, já perto do final dos anos 60, com o grupo Os Mamíferos, que sacudiu o provincianismo de Vitória com suas guitarras distorcidas e visual maquiado (isso quatro anos antes de os Secos & Molhados). Fiz cerca de 70 entrevistas com músicos de várias gerações, além de pesquisas em jornais de Época para contextualizar os fatos e bastidores de um período de saudável amadorismo. A opção por fechar o livro em 1995 atende a uma mudança de perfil: neste ano, com o advento do Mangue Beat, a cena mudou consideravelmente. As bandas deixaram de imitar o rock anglo-saxônico e passaram a buscar referências folclóricas de suas regiões, o que, no Espírito Santo, deu origem ao Mahnimal, Casaca etc, além da ascensão do reggae, hardcore, hip hop, música eletrônica, entre outros estilos. Formou-se uma outra cena, que pode ser o tema de outro livro.


2. Fazer arte no Espírito Santo é um desafio, pois o espírito-santense valoriza pouco os artistas locais. Porque nosso Estado, rico culturalmente, tem tanta dificuldade em vender e propagar a arte?
R. Essa é uma questão complicada porque envolve diversos fatores. Um deles é a baixa autoestima da população que se acostumou a ficar de fora das principais decisões políticas do país. Como afirma Gilberto Gil, "o Espírito Santo é um Estado periférico", que, embora próximo da indústria da comunicação e do entretenimento, não foi capaz de desenvolver uma estrutura para garantir a sobrevivência de seus artistas. Muitas bandas originais e talentosas ficaram no meio do caminho por falta de apoio empresarial e do Estado, e pela ausência de estúdios de gravação, a dificuldade de acesso a instrumentos etc. Estamos falando de um tempo em que não havia internet, celular, a comunicação era precária. Espero que o livro ajude a revelar aos capixabas uma intensa movimentação cultural que ocorreu por essas bandas, e que as novas gerações não repitam os erros das antecessoras.


3. Um dos problemas de se fazer arte no Espírito Santo é a formação de público, conseguir atrair pessoas para os teatros, shows e espetáculos de artistas locais. Por que essa supervalorização de artistas nacionais em detrimento dos artistas locais? 
R. Infelizmente existe esse complexo de inferioridade. A geração que conseguiu arrebanhar público, ás vezes de 30 mil pessoas por show, foi a do Casaca e do Mahnimal, mas o público se cansou dessa fórmula de rock/reggae/congo e a deixou de lado para ir atrás da axé music, sertanejo universitário e de outros modismos que volta e meia surgem na indústria musical. O capixaba deveria prestar mais atenção à produção local, não só na música, como também nas artes, cinema e literatura, Área em que temos uma forte tradição de autores representativos. Mas deve fazê-lo com olhar critico; prestigiar os artistas locais, mas cobrar deles qualidade, exigir um padrão competitivo. O capixaba deveria fazer suas próprias escolhas culturais, ao invés de consumir passivamente um tipo de entretenimento descartável que em pouco tempo será esquecido em função de outros modismos.


4. No início da década de 90 - última década relatada no seu livro -  surgiram duas bandas de rock, que marcaram época e que hoje fazem sucesso internacionalmente, Dead Fish e Mukeka di Rato, para você essas bandas e a geração que precedem foram influenciadas pelas bandas relatadas no Rockrise?
R. Sim, porque tudo faz parte de uma evolução. O Dead Fish, por exemplo, começou como Stage Dive, a banda dos skatistas, e tinha como referências Skelter e The Rain, compunha em inglês, e só depois de algum tempo encontrou a sua identidade musical. O Mukeka di Rato não seria possível sem o punk dos anos 80. Bandas como Zoopatia e Ferida Exposta cumpriram essa função no Estado. Nos anos 80 Vitória era essencialmente metaleira, não havia o hardcore como conhecemos hoje (embora nos EUA essa vertente já¡ fosse uma realidade desde o início da década). Então os meninos começaram a tocar o som punk com mais rapidez, intensificaram o inconformismo das letras e propiciaram o surgimento dessa cena hardcore no Estado, principalmente em Vila Velha.


5. Além de jornalista, escritor o senhor também é músico, qual a principal diferença do rock produzido entre as décadas de 60 e 90 para o rock produzido hoje?
R. Cada década tem suas peculiaridades. O auge do rock se deu entre 1965 e 1975, com a magia dos Beatles, Rolling Stones, Dylan, The Who, Hendrix, Cream, Led Zeppelin, Pink Floyd, Yes, Deep Purple, Black Sabbath, AC/DC. A geração dos anos 80 também deixou sua marca com o metal, os darks, os new wavers. Os anos 90 já assinalaram uma diluição rumo ao comercialismo. A principal diferença, para mim, é que as grandes bandas não se renovaram. Hoje o mundo caminha muito rapidamente e os músicos não conseguem dar sequência a uma carreira. Pode-se contar nos dedos as bandas surgidas em 1990 que se mantém em atividade até hoje. A indústria valoriza cada vez mais a superficialidade, o descartável, o sucesso e o lucro imediatos, o consumo rápido, e as bandas de rock parecem ter se acomodado diante dessas regras. Salvo raras exceções (Pearl Jam é uma delas), fazem o jogo da indústria e repetem clichês para se manter no topo. A esperança está na chegada de uma geração engajada na produção independente, nos festivais, na distribuição digital, e enfim, na atualização do ideal punk faça você mesmo. O sopro de renovação sempre virá dos independentes.